Supernova - Stellae e Cold

— Colddie, a gente vai encontrar esse tal de líquido, fica calma.

Apesar de ter dito aquilo num tom calmo ao observar a garota tocar nervosamente o corpo, sabia que estava ao meio de um alvoroço, sem tempo pra brincadeiras, devia ser breve e sair logo dali, mesmo sabendo que não ficariam realmente seguras em sequer algum lugar. Só queria acabar logo com aquilo.

— Eu sou espiã. Com certeza tenho muitas utilidades pra sequer o que você precisa.

A conversa fora interrompida pelos alto-falantes, anunciando a procura por ambas, podiam ouvir os passos da patrulha averiguando o local, a qualquer momento poderiam achá-las ali.

— Vamos ser mais rápidos, por favor.
— Disse, em um tom mais baixo.

Ainda que conversem, o silêncio da noite é denso e o mínimo barulho, até aqueles um pouco distantes, não facilmente audíveis. Eles aproveitam os últimos instantes para se planejarem logo após o anúncio feito pelos soldados, mas a cada segundo o tempo se torna mais curto para eles. Com um mínimo de atenção, já é possível ouvir uma conversa baixa e passos se aproximando cada vez mais, e após terem suas características anunciadas por aí, seria perigoso que Stellae e Cold fossem avistadas mesmo que por cidadãos comuns.

— E então, onde foi que viram essas meninas pela última vez mesmo? — Uma voz masculina pergunta, tão distante quanto os passos no chão.

— Ah, não sei direito. Me disseram que foi perto de um galpão velho, mas não sei direito onde isso fica. De qualquer forma, isso não vai ajudar muito mesmo. Elas certamente já estão bem longe de lá, a não ser que sejam muito burras. Mas não parece ser o caso, se não o capitão não teria sido rendido por elas fácil assim. — Uma voz feminina responde, já um pouco mais próxima.

— Nem me fale. Não acredito que o capitão perdeu pra duas garotinhas, ele deve ter pegado leve demais com elas e esperado que se entregassem na delegacia por vontade própria. — O homem responde mais uma vez, ainda mais perto. Para os três presentes, é claro que se não saírem dali logo serão encontrados, principalmente por conta do forte odor exalado pelo cadáver.

Como não estava participando da conversa — não diretamente —, não foi difícil para Cold identificar as vozes que iam se aproximando cada vez mais do lugar onde estavam, o que era, no mínimo, alarmante, e para piorar, o assunto eram as duas garotas que agora eram fugitivas. Realmente, seriam muito burras se tivessem continuado lá perto.

— Stellae e Cold precisam ir — Cold se pronunciou em tom baixo, visando a proximidade dos "Convidados", e procurando com seus olhos por um lugar onde pudesse escapar, o mais rápido possível. Felizmente, estavam ao lado de um prédio cujo escadas passavam pelas janelas de todos os andares, até chegar em sua cobertura. Não deveria ter ninguém por lá, e se tivesse, seria muita falta de sorte da pessoa.

Mas... e se desse errado? Não pareciam ter muitas opções de como correr por ali. Cold engoliu a seco, mais uma vez presa em seus próprios pensamentos. O relógio passava. Tic-tac, tic-tac.

— Para, Cold! — Exclamou para si mesma, dando um tapa em sua própria face. Talvez tivesse assustado os seus companheiros. Oh, droga. Olhou bem para os rostos dos dois e começou a subir as escadas, abandonando o corpo. — Entraremos em contato. Cuide dela~ — Foi somente o que ela disse para a raposa, abandonando sem mais nem menos o corpo da kroyvisiana e esperando que Stellae a seguisse, subindo as escadas.

— Somos fugitivas, não? Você nos t---- — A conversa fora interrompida pelos passos vagando na rua e pela conversa que, por sinal, dizia a respeito das duas foragidas, e, de imediato deveria sair logo dali antes que a situação piorasse, mais ainda.
Um breve olhar foi direcionado para a pequena, que ainda carregava o corpo podre da mulher, não seria difícil achá-las ali só por aquele cheiro, mas de qualquer forma precisavam a largar ali mesmo, com a raposa, e fora o que a pequena fez, após isso sair correndo. Não demorou para que fizesse o mesmo.

— Bom, isso é verdade. Mas de toda a forma, você não deveria subestimá-las se provavelmente aconteceria o mesmo com você, Dhake. — A mulher provoca o companheiro, seguido de uma leve risada irônica.

Ainda com a situação de risco e da missão que foi designada aos dois oficiais por seus superiores, eles mantêm sua conversa calmamente enquanto procuram brevemente pelas garotas pelos lugares onde passam. Logo, Cody e Stellae podem fugir através do prédio, e com a distração criada por Renard, elas podem enfim aproveitar e ir para bem longe dali.

Elas podem subir através da escada de emergência, visto que a mesma nunca é utilizada e existe apenas por motivos de segurança. Através das pequenas janelas, elas podem ver que o dia aos poucos começa a amanhecer, e chega a hora das meninas enfim decidirem seu destino: tentar deixar aquele planeta em segurança ou insistir no plano com Renard e correr o risco de serem pegas pelas autoridades da Aliança. De qualquer maneira, precisariam deixar o local logo para não serem pegas.

O chamado de ajuda da Raposa faz com que os soldados se calem e prontamente correm para encontrá-lo. Há pouco tempo estes imaginariam que seriam eles que fariam algo relevante nesta noite. O garoto, em especial, tendo conseguido ingressas nas forças da Aliança há poucos meses, jamais fez nada além de correr atrás de ladrõezinhos de loja em Gradopolis. Diante da urgência e de toda a ansiedade de uma futura promoção, eles não tardam a chegar ao seu destino. E o cheiro forte de putrefação exalado pelo cadáver também auxilia na localização rápida.

Com a aproximação dos dois e através da luz escassa da rua deserta, o médico pode enfim vê-los. O homem é um humano de rosto muito jovem e cabelos escuros e muito curtos. Já a mulher, é uma kroyvisiana de cabelos e olhos muito claros, aparentemente um pouco mais velha do que o garoto. A primeira reação dos dois ao identificar aquele que os chamava há pouco é suspeitar dele, assim como todos costumam fazer. Mas ao verem o símbolo da Aliança em seu avental médico e notar que ele tenta verificar se a kroyvisiana está viva, eles decidem ao menos dar um voto de confiança para o Iomarshiano e tentar deixar os preconceitos um pouco de lado.

Mas ao reparar melhor no cadáver jogado no chão, Lucy rapidamente aproxima-se do corpo feminino para enxergá-lo melhor. Ela parece reconhecê-la, e uma expressão que mistura horror e tristeza toma conta de sua face, mas não vai além disso. Precisa manter-se forte e terminar sua missão e vingar sua antiga companheira, afinal. Ela volta seu olhar para os dois presentes, determinada. O garoto permanece o tempo todo de pé, firme em sua posição.

— É a Oficial Bhailin, Dhake. Estudamos juntas na academia... Eu tinha ouvido que ela foi atacada e que seu corpo estava desaparecido, só não estava conseguindo acreditar nisso ainda. Mas fico feliz que a encontramos.

Dhake permanece calado por alguns instantes. Não conheceu a mulher em vida, mas tenta respeitar os sentimentos da companheira. Ele mantêm-se atento ao seu redor, e dirige seu olhar brevemente para Renard, concentrado.

— Para onde os fugitivos foram, doutor? Por acaso não eram duas garotas pequenas e de cabelos claros?

Dhake:

Lucy:

Ajoelhou-se no chão da cobertura do prédio, puxando a garota contra si em um ponto cego para que nenhum deles lá em baixo as encontrassem ali.
Ouvia a conversa em um tom quase inaudível, mas já tinha a noção do que era, e mais do que nunca deveria arrumar um meio de sair dali, não fazia ideia de como. Mas sabia com quem devia contar.
Retirou o smartphone das vestes e, com os dedos trêmulos, deslizou o tópico dos Contatos, até chegar em "Willie ♡". Pressionando o polegar no botão "Áudio".

— Willie, eu preciso da sua ajuda. Agora. Agora mesmo, por favor.

Deixou um longo suspiro escapar dos lábios, deslizando as costas da mão pela testa, com a respiração ofegante.

Dessa vez, pôde dar um suspiro de alívio quando recebeu a resposta de Willie rapidamente, esboçando um pequeno sorriso nos lábios, o que sempre se abria em seu rosto quando estava com ele, ou falando com ele. Mesmo que não parecesse, ela tinha um lado mole que só era realmente visível com Willie. Não tardou para mandar a localização, seguida da mensagem: "Sim, estou com a Colddie aqui, e ela aprontou muito hoje, não que seja novidade.
Estou te esperando, Willie.
♡"
Após isso, guardou o smartphone nas vestes, caminhando para o muro da cobertura em passos lentos e longínquos, direcionando o olhar atento para as ruas de modo que não fosse vista, uma multidão caminhava pelas ruas e o alvoroço era enorme. Muita gritaria.

Dhake, já preparado para qualquer coisa, rapidamente retira a arma que carrega na cintura e corre na direção indicada por Renard. Não quer de forma alguma perder a chance de encontrar aquelas garotas e levá-las para a delegacia de uma vez por todas, como seu superior já deveria ter feito quando as encontrou.

Já Lucy, ergue seu corpo novamente e enfim sai de perto do cadáver da colega para aproximar-se um pouco da raposa. Mesmo com os olhos tristes, ela sorri para ele, tentando passar segurança e tranquilidade. Seu tempo é curto e seu companheiro que não a compreende certamente reclamaria muito disso depois, mas esse é justamente o motivo por trás de ter se tornado policial: cuidar das pessoas. Assim como o Iomarshiano que encontra-se na sua frente, ela imagina. Então seu trabalho ali torna-se ainda mais importante.

— Não se preocupe, senhor. Esse é o nosso trabalho. Está tudo bem agora, tá? Pode ficar tranquilo. Desculpe por não termos chegado antes, mas agradeço muito pelas informações e fico muito aliviada que esteja bem. — Ela retira a arma da cintura assim como o colega fez há pouco, já se preparando para ir. — Agora, prometo que daremos nosso máximo e vamos pegar logo essas garotas. Ah, o senhor é médico, não é? Preciso de um favor seu. Se puder levar o corpo da Oficial para análise, eu ficaria muito grata. Mas depois volte para casa e descanse, foi uma noite longa para todos.


Ela enfim percebe o tempo que o discurso estava lhe tomando, e enfim corre atrás de seu companheiro a fim de alcançá-lo. Assim, os soldados somem de vista do médico e o som de seus passos torna-se cada vez mais distante até que ele não possa mais ouvi-los. Mas isso não torna as ruas mais seguras, visto que uma enorme quantia de pessoas saíram para caçar as garotas. E Renard pode imaginar que seria melhor sair logo dali e levar aquele corpo, uma vez que até os mesmos oficiais possam retornar ao não encontrá-las pela direção indicada. Assim como Stellae e Cold, que precisam arrumar um jeito para sair do prédio sem chamar mais a atenção de ninguém.

Rosnou baixinho quando Stellae pressionou o seu corpo ao dela. Nunca gostou de tanta proximidade, não era porque estavam fugindo da polícia em uma situação crítica que ficaria quieta! Distanciou-se brevemente da garota, querendo prestar atenção na conversa que rolava mais para baixo com o seu estranho... companheiro? E os oficiais. Preferiu ignorar o que quer que Stellae estivesse falando com seu irmão — principalmente por envolver aqueles apelidos estranhos.

Mordeu o lábio inferior enquanto se aproximava minimamente da borda para ver se capturava alguma característica dos caras que provavelmente estariam atrás das duas por um bom tempo, mas eles já haviam ido embora. Encarou Stellae por alguns segundos antes de murmurrar, de forma preguiçosa: — Onde a gente vai agora?